Wednesday, January 03, 2007

A madeira e o Vinho


Na história da enologia, vinhos e madeira evoluíram de forma paralela e indissociável, até porque esta era uma matéria-prima abundante em todos os continentes e de fácil utilização e manuseamento. Depois, razões de origem económica e tecnológica - a escassez das madeiras nobres para o vinho, os custos de mão-de-obra para o fabrico e manutenção dos cascos, a introdução do inox como material inerte e de fácil manutenção e higienização, - relegaram para segundo plano este nobre material.

Nos últimos 10 a 15 anos assistiu-se a um regresso às origens, sendo nos dias de hoje sobejamente conhecidas as inegáveis características aromáticas e gustativas que a boa madeira pode conferir, não a todos, mas a alguns vinhos.

À luz dos actuais conhecimentos, poderemos resumir a tipologia das melhores madeiras utilizadas em enologia em dois tipos, de acordo com a sua origem. O carvalho americano ( Quercus alba) e o carvalho europeu (Quercus petraea e Quercus robur), com particular ênfase para o carvalho francês.
O carvalho nacional e o carvalho das florestas da europa do leste terão certamente características igualmente desejáveis mas, o peso económico que a indústria de tanoaria tem nos Estados Unidos da América e em França, associado a investigações de cariz académico, resultaram numa imagem mais elitista e, quiçá, mais justa, para a madeira daqueles países.

Mantendo a linguagem simplista diremos ainda que o carvalho americano está mais indicado para melhorar a qualidade dos vinhos brancos, enquanto que o francês está mais associado aos vinhos tintos (carvalho da região de Allier) ou aguardentes (carvalho da região de Limousin).
Mais ainda, admite-se ser vantajoso que os brancos fermentem e sejam conservados em madeira, enquanto que os tintos não deverão fermentar na madeira, apenas deverão estagiar.

Comum a todos os vinhos que estagiem (reduzido período de contacto) ou envelheçam (significativo período de contacto) em madeira, temos a penetração lenta e contínua de oxigénio o que, durante a fermentação alcoólica se revela particularmente favorável às leveduras, favorecendo reacções químicas diversas que se traduzem numa maior estabilidade da côr, diminuição da adstringência (sensação algo equivalente a que se sente quando se comem diospiros pouco maduros) e aumento da complexidade organoléptica do vinho.

A transformação e extracção de compostos da madeira directamente para o vinho, depende de vários factores. Uns derivados do próprio vinho – se é ou não jovem, se está ou não filtrado, se tem muito ou pouco teor álcool, etc.- outros derivados da própria madeira – o tipo, a origem, a tecnologia de secagem, a tecnologia de fabrico dos cascos. Destacamos neste último factor a chofa (queima) a que é submetido o interior do casco durante o seu fabrico, já que contribui para o enobrecimento da madeira, integrando-se assim esta mais subtilmente no vinho, pelas notas aromáticas (caramelo, baunilha torrada,…) e gustativas (chocolate, amêndoa,…) que normalmente lhe confere.

Mas, não se julgue que o simples facto de um qualquer vinho ser estagiado ou envelhecido em madeira de qualidade, resulta obrigatoriamente num produto distinto. A boa madeira não faz o vinho, antes o complementa, ou seja, um vinho sofrível por falta de estrutura ou equilíbrio entre os seus componentes (álcool, ácidos, taninos, corpo,...), não se transforma, no interior de um casco, num vinho de eleição. O vinho tem de suportar a madeira e não de surgir diluído nela.

Esperemos que a recente legislação (Código Internacional de Práticas Enológicas) que aprova e define a utilização de aparas de madeira no vinho, não sirva para camuflar defeitos em vez de enaltecer virtudes….

1 comment:

Anonymous said...

Interessante...
A madeira parece-me uma boa opção desde que utilizada com equilíbrio e sabedoria. Começa até, de há já algum tempo a esta parte, a ser utilizada em vinhos brancos com resultados surpreendentes pela positiva.
Abraço
Filipe Forte de Faria